Entenda os seus direitos e as obrigações das plataformas diante do risco de dependência em jogos de azar.
Introdução
Com o crescimento das apostas esportivas online, cada vez mais brasileiros têm se envolvido com plataformas digitais que prometem lucro rápido e diversão. Embora as chamadas “bets” estejam legalizadas no Brasil desde 2018, a ausência de controle rígido pode expor os consumidores a um problema sério e muitas vezes silencioso: o vício em jogos de azar, também conhecido como jogo patológico.
Mas afinal, quem é responsável quando o entretenimento vira um transtorno? E o que a legislação brasileira prevê para proteger consumidores vulneráveis?
Apostar é legal, mas exige responsabilidade
As apostas de quota fixa (como em sites de futebol, basquete, etc.) são permitidas por lei no Brasil desde a publicação da Lei nº 13.756/2018, regulamentada posteriormente pelo Ministério da Fazenda. Contudo, a legalidade da atividade não isenta as empresas do dever de proteger seus usuários.
A proteção ao consumidor vulnerável
Segundo o Código de Defesa do Consumidor (CDC), empresas devem agir com boa-fé, transparência e responsabilidade, especialmente diante de consumidores em situação de vulnerabilidade.
O artigo 6º do CDC reconhece como direito básico do consumidor: “a proteção contra métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas”.
E mais: o artigo 39 proíbe práticas que explorem a inexperiência ou o estado emocional do consumidor. Isso se aplica a casos em que a plataforma:
– Estimula apostas excessivas com bônus ou promessas enganosas;
– Não disponibiliza ferramentas para controle de tempo e limites de apostas;
– Ignora sinais de comportamento compulsivo.
Ou seja, as plataformas têm responsabilidade objetiva, podendo ser responsabilizadas civilmente por danos causados a consumidores que desenvolveram vício e não foram devidamente protegidos.
E a LGPD? Seus dados também estão em jogo
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) também impõe deveres às plataformas. Informações sobre volume de apostas, tempo de uso e padrão de comportamento do jogador são dados sensíveis, e seu tratamento deve observar o princípio da prevenção.
Se uma empresa identifica comportamento de risco, mas omite medidas de proteção (como suspender a conta, oferecer canais de ajuda ou limitar apostas), pode ser considerada negligente.
O jogo patológico é um problema de saúde mental
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o vício em jogos como um transtorno mental. O Brasil, como signatário de tratados internacionais de proteção à saúde e à dignidade humana, tem o dever de coibir práticas comerciais abusivas que levem o consumidor à compulsão.
Hoje já existem iniciativas de autorregulação no setor, mas ainda sem eficácia obrigatória. O apostador que se sente prejudicado pode buscar reparação judicial por danos morais e materiais.
O que o consumidor pode fazer?
Se você ou alguém próximo estiver enfrentando dificuldades com apostas online, é possível buscar proteção legal. Veja algumas medidas:
– Solicitar autoexclusão voluntária da plataforma;
– Exigir limites de depósito e de tempo de uso;
– Registrar denúncias nos órgãos de defesa do consumidor (Procon);
– Buscar indenização por danos se houver omissão da empresa.
Conclusão
Apostar online não é crime — mas ignorar os efeitos do vício e a responsabilidade das plataformas, sim. A legislação brasileira reconhece o consumidor como a parte mais frágil na relação com grandes empresas, e por isso impõe deveres claros de cuidado, informação e prevenção de danos.
Se você sente que perdeu o controle ou conhece alguém nessa situação, saiba que a lei está do seu lado — e que a busca por ajuda é um passo de coragem e não de fraqueza.
A Dra. Ana Paula Bortolanza Ruppenthal é advogada desde 2017, especialista em Direito Público e mestre em Relações Internacionais. Atua nas áreas cível, consumidor e criminal.
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